2 em cada 3 adolescentes que morreram de forma violenta em SP estavam fora da escola; polícia é responsável por 35% das mortes, acima da média nacional

Um estudo publicado nesta terça-feira pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) apontou que, entre 2018 e 2020, 1.309 adolescentes foram mortos de forma violenta no estado de São Paulo.

Desse total, 699 vítimas estavam cadastradas na base de dados da Secretaria Estadual de Educação (Seduc). Dentre elas, 66% tinham evadido da escola sem ter concluído o Ensino Médio quando morreram.

“A violência letal, com frequência, é o último estágio de uma série de violações de direitos a que crianças e adolescentes estão submetidos. Não podemos de fato afirmar qual seria a ordem dos fatos nessa relação de educação x violência, o que sabemos é que o acesso e a permanência na escola são fatores fundamentais para proteger a vida de crianças e adolescentes”, diz Adriana Alvarenga, chefe do escritório do Unicef em São Paulo

A escola representa não somente um espaço de proteção, mas também um fator de desenvolvimento para essa criança e esse adolescente que terão mais oportunidades positivas ao longo da vida, ficando menos expostos aos riscos de morte prematura causada pela violência letal.

Além disso, o relatório também aponta que, entre 2015 e 2022, 3.947 pessoas de até 19 anos morreram de forma violenta, sendo que 2.539 foram vítimas de homicídio, latrocínio e lesão corporal seguida de morte, e 1.408 (35,6%) foram mortas em contextos de intervenção policial (leia mais abaixo).

O número revela que o estado de São Paulo fica acima da média do país quando o assunto é morte decorrente de intervenção policial (MDIP) entre adolescentes: as polícias brasileiras foram responsáveis por 16,5% das mortes violentas intencionais de adolescentes no Brasil nos últimos três anos.

A pesquisa ‘O impacto das múltiplas violações de direitos contra crianças e adolescentes – Uma análise intersetorial sobre as mortes violentas de crianças e adolescentes no estado de São Paulo de 2015 a 2022’ foi feita em parceria com o Comitê Paulista pela Prevenção de Homicídios na Adolescência (CPPHA) e o Governo do Estado de São Paulo, por meio da Secretaria de Justiça e Cidadania.

O que diz o governo
Em nota, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) afirmou que as mortes em decorrência de intervenção policial “são resultado da reação de suspeitos à ação da polícia.”

No texto, a pasta ainda alega que todos os casos que ocorrem em São Paulo “são rigorosamente investigados pelas polícias Civil e Militar, com acompanhamento das respectivas corregedorias, Ministério Público e Poder Judiciário.”

“Para reduzir a letalidade, a SSP-SP investe continuamente na capacitação do efetivo, aquisição de equipamentos de menor potencial ofensivo e em políticas públicas. Além disso, os cursos ao efetivo são constantemente aprimorados e comissões direcionadas à análise dos procedimentos revisam e aprimoram os treinamentos, bem como as estruturas investigativas”.

Evasão escolar
Em relação aos adolescentes evadidos da escola que morreram, mais da metade (51%) abandonou o ensino entre o 9º ano do Ensino Fundamental e o 2º ano do Ensino Médio.

Segundo o estudo, o 1º ano do Ensino Médio tende a ser o ano crítico de abandono, já que cerca de 33% desses adolescentes abandonaram a escola nesse período.

Os dados também apontam que, em 70% dos casos, a morte ocorreu entre 1 e 2 anos depois da evasão escolar.

De acordo com os dados da Seduc, 70% dos adolescentes que morreram de forma violenta tinham tido alguma reprovação no histórico escolar: mais da metade estava 2 ou mais anos atrasado.

Média baixa no IDEB
Em 2019, as escolas frequentadas pelos adolescentes que morreram de forma violenta tinham média no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) nos anos finais do Ensino Fundamental de 5,1, enquanto a média do estado de São Paulo era 5,5.

Para as escolas de Ensino Médio frequentadas pelos adolescentes identificados, a média do IDEB em 2019 era 4,1, enquanto a média do estado era 4,6

Mortes decorrentes de intervenção policial (MDIP)
Dados preliminares mostram que, em 2023, foram registradas 501 mortes decorrentes de intervenção policial, sendo que 84 vítimas tinham até 19 anos (17% dos casos). Em comparação a 2022, isso representa um aumento de 19% para todas as faixas etárias e 23% para pessoas até 19 anos.

Entre 2015 e 2022, foram registradas 1.408 mortes de pessoas de até 19 anos em decorrência de intervenções policiais:

1401 era meninos, e 7 eram meninas;
68% dos meninos eram negros;
57,2% das meninas eram negras.
No total, foram registradas 6.161 ocorrências desse tipo entre 2015 e 2022 em todas as faixas etárias. Nesse contexto, houve redução de quase 50% entre os anos de 2020 e 2022.

Mortes violentas e Fundação CASA
De acordo com o estuado, metade dos adolescentes vítimas de violência letal e egressos da Fundação Casa morre em menos de um ano após cumprimento de medida socioeducativa em meio fechado

Do total de mortes de crianças e adolescentes de até 19 anos por homicídio doloso, latrocínio, lesão corporal ou em decorrência de intervenção policial entre 2015 e 2020, 29% dos adolescentes identificados tinham cumprido medida de internação na Fundação CASA.

Em relação ao critério racial, considerando adolescentes que morreram de forma violenta: 26% dos brancos tinham passado pela Fundação Casa; entre os pardos eram 31%, e entre os pretos chegavam a 34%.

A análise dos dados da Fundação CASA apontou também que, em média, os adolescentes que morreram cumpriram 180 dias de medida de internação, e que, em média, eles entraram na instituição aos 16 anos e saíram com 17 anos.

Fonte: G1

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