As apostas em loterias e em jogos online são vistas como investimento para 14% dos trabalhadores. Além disso, 71% dizem trabalhar melhor quando estão com as contas em dia, gerando maior produtividade e menos horas extras. Já quando estão endividados, 64% afirmam que não conseguem cumprir demandas básicas, como horário de trabalho, e 66% dizem que os problemas financeiros impactam diretamente na saúde mental, relatando situações de estresse, ansiedade e insônia
Os dados são da pesquisa realizada pela Creditas Benefícios, em parceria com a Opinion Box, para avaliar como os trabalhadores se relacionam com questões como finanças, saúde mental e educação financeira. O levantamento, realizado com 1.347 trabalhadores em regime CLT nas cinco regiões do Brasil, apresentou a educação financeira como o caminho para um futuro mais saudável, com 73% afirmando que essa é a melhor forma de melhorar a gestão do próprio dinheiro.
“Os dados mostram o real impacto das dívidas na saúde mental do trabalhador e também em sua produtividade dentro do ambiente profissional. Em um cenário de alto endividamento, como o brasileiro, é necessário entender como combater esse problema e os processos que podem apoiar o trabalhador na construção de um futuro financeiro mais saudável”, afirma Guilherme Casagrande, educador financeiro da Creditas.
O nível de endividamento dos consumidores atingiu 78,5% das famílias brasileiras em julho deste ano, uma redução de 0,3 ponto percentual em relação a junho, mas acima do registrado em julho de 2023 (78,1%), segundo dados da Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC).
O levantamento também observou a tendência das apostas online no país. “A gente vive em um momento em que as Bets estão aumentando, e temos números de que cerca de 30 milhões de pessoas contam com as apostas como planejamento financeiro. A nossa pesquisa mostra que 14% atribuem às casas lotéricas e aos sites de apostas todo o planejamento financeiro da sua jornada com dinheiro. Isso é muito grave”, acrescenta o educador financeiro.
Entre os principais pontos estão:
71% das pessoas performam melhor quando estão com as contas em dia.
64% afirmaram não conseguir cumprir horários de trabalho por conta do endividamento.
66% afirmam que sentem que os problemas financeiros impactam diretamente na saúde mental.
73% das pessoas afirmam que a educação é a melhor forma de evoluir na gestão do próprio dinheiro.
92% acreditam que as empresas devem oferecer educação financeira como um benefício, mas apenas 30% tiveram algum tipo de contato com o tema no emprego atual.
75% atribuem ao RH a demanda de educação financeira.
61,5% notaram evolução positiva do seu conhecimento em educação financeira tendo contato com o tema na empresa atual.
Profissionais de RH
Com a relação direta da saúde financeira com a atuação no trabalho, 92% dos respondentes pensam que as empresas devem oferecer educação financeira como um benefício, apesar de apenas 30% terem algum tipo de contato com o tema no emprego atual.
Os profissionais de RH são os mais citados como os responsáveis pela oferta de educação financeira nas empresas (75% dos respondentes). Entre os trabalhadores que tiveram contato com ações de educação no emprego atual, 61,5% afirmam que notaram uma evolução positiva no seu conhecimento sobre o tema.
“Os resultados da pesquisa nos mostram que os trabalhadores querem entender mais e precisam ter acesso ao tema, que é, comprovadamente, uma forma eficaz para maior engajamento, produtividade e, consequentemente, uma vida mais tranquila”, complementa Guilherme. Veja a seguir a entrevista com o educador financeiro:
O que mais chamou a atenção na pesquisa?
Guilherme Casagrande – Eu trabalho com educação financeira há bastante tempo, acho que cada vez mais a gente está conseguindo falar de finanças relacionando com qualidade de vida. Dinheiro vem sempre numa caixinha relacionada ao medo, como algo difícil ou algo ruim. Um dos sentimentos que mais aparecem nas nossas pesquisas é o medo. A gente começa a perceber uma correlação cada vez mais envolvendo a questão de qualidade de vida ao mundo financeiro, tanto em relação à saúde mental quanto à qualidade de vida de uma maneira geral. Ao mesmo tempo que não é agradável ver tantas respostas que não são tão positivas, é interessante saber que as pessoas estão percebendo que a saúde financeira tem sim uma relação com a qualidade de vida de uma maneira geral.
Isso seria o primeiro ponto para ter uma mudança de comportamento?
Guilherme Casagrande – É uma porta de entrada para as pessoas colocarem a saúde financeira como pauta. As pessoas acabam tratando a vida financeira como algo mais distante, como algo mais difícil, como algo mais complexo, e nesta pesquisa a gente conseguiu perceber que isso está virando uma demanda. Apesar de estimulado em parte pelo próprio RH das empresas, ou até mesmo porque a pessoa quer evoluir os conhecimentos em educação financeira, essa é uma porta de entrada. O simples fato de as pessoas estarem priorizando a qualidade de vida financeira, acho que é um grande avanço.
E como as empresas têm atuado nisso?
Guilherme Casagrande – Temos um programa de educação financeira que a gente leva para as empresas, que dura em média 15 meses, e o nosso objetivo é começar a falar desde organização financeira, que é um tema muito básico e simples, chegando ao mundo dos investimentos, onde a agente aprofunda mais os conhecimentos em termos de risco, renda fixa, renda variável, fundos e previdência. E a nossa expectativa é conseguir trazer esse assunto de educação financeira de uma forma mais leve, mais desconstruída. Hoje nós temos um engajamento de colaboradores de empresas de todo o Brasil.
Vocês perceberam mudanças no comportamento do trabalhador com o programa Desenrola Brasil, do governo federal, que renegociou mai de 15 milhões de dívidas?
Guilherme Casagrande – Sim, essa iniciativa do governo de criar o Desenrola, que é uma plataforma de negociação de dívidas, foi um momento de fôlego para os brasileiros, estrategicamente, super necessário. A gente está na marca de quase 73 milhões de pessoas inadimplentes em nosso país, entre aspas, com o famoso nome sujo. Isso de alguma forma acaba tirando qualidade de vida e atrasando a nossa economia em certos aspectos, porque as pessoas não têm acesso a crédito de uma maneira ampla. Então o Desenrola e todas as iniciativas que estão sendo desenvolvidas nesse sentido, principalmente pós-pandemia, vêm com sentido de permitir que as pessoas consigam sair de uma situação desconfortável, financeiramente falando. Tanto o Desenrola como os feirões de instituições têm conseguido fazer com que todo mundo lide com a vida financeira de uma maneira um pouco mais clara, consiga negociar dívida com descontos, com o valor de origem da dívida, até mesmo mais baixo. E isso se traduz com certeza em qualidade de vida.
Quais são as principais dicas para o trabalhador?
Guilherme Casagrande – Como educador financeiro, eu sempre falo que as pessoas precisam ter o autoconhecimento, e o autoconhecimeto funciona muito bem quando a gente fala em termos de saúde mental. E dessa mesma forma funciona com a vida financeira. Você entender o que é importante, por que o seu dinheiro é relevante, quais são as coisas significativas para você, sua família e as pessoas que dependem financeiramente de você. E o brasileiro e brasileira, via de rega, costumam lidar com a vida financeira num segundo plano. “Boletos vão chegando, vou pagando; tive necessidade de comprar alguma coisa, passo no cartão ou faço um Pix.” Acaba não assumindo o cenário de protagonismo na propria vida financeira. O autoconhecimento financeiro, combinado a uma estratégia de organização financeira, é a chave para ter sucesso nessa relação.
Sempre recomendo que as pessoas invistam de 15 a 20 minutos semanalmente cuidando do próprio dinheiro. Muita gente pensa que é muito trabalhoso. “Vou ter que anotar todos os meus gastos, vou ter que anotar todas as minhas receitas”. Esse é o caminho ideal, mas a gente sabe que olhando para o mundo real isso não é tão intuitivo de fazer. Mas entender um comportamento que esteja levando uma parte do dinheiro semanalmente, saber que essa semana tem o aluguel para pagar, saber que essa semana vence fatura da luz, tendo essa aproximidade com a vida fiananceira, é o que muda tudo. Dados apontam que quase metade da população não sabe quanto ganha nem como está gastando o seu dinheiro. É super importante que a gente crie momentos de aproximação financeira. A partir dessa aproximação a gente consegue se reconhecer financeiramente.
Quais as tendências, o que pode mudar daqui para a frente?
Guilherme Casagrande – A gente vive um momento muito interessante, até por uma determinação do Banco Central, que defende que as instituições financeiras precisam falar de educação financeira para todas as pessoas. Então a gente vive uma página nova no nosso país, onde a educação financeira vai se tornar cada vez mais presente, dentro da nossa rotina, dentro do nosso dia a dia, dentro do nosso jeito de lidar com o dinheiro. Isso é uma tendência muito positiva de as pessoas começarem a criar o gatilho de olhar para a vida financeira de um jeito não tão polêmico, não tão difícil e complexo. Cada vez mais, as empresas vem sendo protagonistas de viabilizarem a educação financeira.
Apesar de ter muitas plataformas e meio de consumir educação financeira hoje, a gente sabe que está longe de um cenário ideal, onde essas informações brotam de maneira intuitiva e ao mesmo tempo vivemos num mundo complexo de qualquer pessoa poder falar qualquer coisa e nem sempre ser uma verdade. Existe uma questão de responsabilidade envolvendo as empresas. Assim como a saúde física, que há um tempo atrás foi pauta superrelevante, e a gente começou a cuidar mais dela. Assim como na pandemia, que veio muito a questão de saúde mental e a gente começou a cuidar mais dela também. Nesse momento, a gente vive uma virada de chave muito interessante em termos de saúde fiananceira. Muito provavelmente que daqui para frente a gente cada vez mais tenha oportunidade para tratar desse tema e falar de uma maneira mais leve, trazendo a educação financeira para todas as pessoas.
A gente vive em um momento em que as Bets estão aumentando, e temos números de que cerca de 30 milhões de pessoas contam com as apostas como planejamento financeiro. A nossa pesquisa mostra que 14% atribuem às casas lotéricas e aos sites de apostas todo o planejamento financeiro da sua jornada com dinheiro. Isso é muito grave. Eu acho que a gente encontrou e cada vez mais vem viabilizando oportunidades para tratar desse tema de uma maneira mais simples, mais desconstruída. Acho que essa é a chave. A partir do momento que a gente levar isso de uma maneira mais leve, a gente vai conseguir chegar a lugares diferentes e a mudar a realidade das pessoas no nosso país.
Fonte: r7