Ataque a bancos e transportadoras gera prejuízo de R$ 424 mi; ousadia desafia polícia

Ataques a instituições bancárias e empresas de segurança especializadas em transporte e guarda de valores de todo o Brasil geraram, em sete anos, um prejuízo de R$ 424.262.887,00. A modalidade criminal, denominada “domínio de cidades”, vem colocando em xeque a eficiência da segurança pública em diferentes municípios do país. Mais bem equipados e organizados do que para roubos ocasionais, grupos com 15 a 30 pessoas conseguem aterrorizar cidades inteiras e controlar pontos estratégicos delas. Fortemente armados com fuzis, metralhadoras e explosivos, eles chegam a usar civis como escudos humanos para inviabilizar a ação da polícia.

O valor roubado, que faz parte de um levantamento realizado pelo policial Ribas, membro do Grupo Alpha Bravo, associação que realiza pesquisas para planejar estratégias que combatem crimes violentos contra o patrimônio, mostra apenas uma dimensão do problema. Há registros de roubos com menor visibilidade em municípios menores que não chegam a ser contabilizados.

O primeiro registro de crime classificado como domínio de cidades do país ocorreu, segundo a pesquisa, em Campinas, no interior de São Paulo, em novembro de 2015. Na ação, 20 criminosos fecharam o município com dinamite, outros explosivos, carros e armas para roubar uma empresa de transporte e guarda de valores. Na ocasião, foram levados R$ 27.961.255,56.

Diferentemente do crime conhecido como “novo cangaço”, realizado exclusivamente em bancos, a modalidade domínio de cidades inclui ações previamente estudadas. Nessas ações, todos os detalhes são planejados e executados por grupos com mais de 15 indivíduos. Ao contrário do que se imaginava até algum tempo atrás, o domínio de cidades não se limita a assalto de agências bancárias ou empresas de transporte de valor. As ações também têm como objetivo atuar na soltura de detentos que cumprem pena no sistema prisional. Para executar o planejamento, o grupo usa as mais modernas tecnologias e conta com a mão de obra de integrantes de facções criminosas para reforçar as ações.

Rastro de terror
Em agosto de 2020, os moradores da cidade de Araçatuba, no interior de São Paulo, viveram cenas de terror após o município ter sido invadido por mais de 50 homens fortemente armados e munidos de modernas tecnologias para realizar o mega-assalto. A ação, que durou cerca de duas horas, sacou quase R$ 4 milhões dos cofres de pelo menos três empresas e traumatizou vítimas mantidas reféns. Famílias sofrem até hoje com a falta das pessoas que tiveram a vida levada pelos suspeitos. A ação deixou três mortos na madrugada do dia 30 de agosto do ano passado.

O ataque mais recente, que também foi classificado como crime de domínio de cidades, segundo Ribas, ocorreu em abril deste ano, em Guarapuava, no Paraná. Nele, 30 suspeitos armados e devidamente equipados com capacetes balísticos e coletes à prova de bala fizeram um cordão humano com civis no em torno de uma empresa de valores para impedir que a polícia interrompesse a ação. Às 22h25 do dia 17, uma explosão orquestrada pelo grupo destruiu parcialmente a empresa. Apesar dos esforços, eles não conseguiram acessar os cofres.

Esses ataques subjugam as forças de segurança, segundo Ricardo Matias, professor de pós-graduação da disciplina “Do Novo Cangaço ao Domínio de Cidades” no curso de Ciências Policiais e Segurança Multidimensional na Escola da Magistratura Federal do Paraná.

“Para mitigar as ações de domínio de cidades, a melhor estratégia são os planos de defesa”, afirmou. O professor explica que os efeitos dessas ações costumam ter grandes proporções porque as forças de segurança são surpreendidas pelos criminosos.

Sem o mesmo poderio, os policiais militares partem para o enfrentamento dos grupos e resgate de eventuais reféns sem equipamentos com avançada tecnologia e sem a devida proteção contra as armas e munições utilizadas pelos oponentes. Dessa forma, reforça o professor, acabam arriscando sua vida. Alguns estados, aponta Matias, como Alagoas, Goiás e Mato Grosso do Sul, têm avançado no combate a essa modalidade criminal.

Entre 2015 e 2022, ao menos 27 ocorrências no país foram classificadas como domínio de cidades e uma na Ciudad del Leste, no Paraguai, que, segundo a Polícia Federal, foi cometida por uma facção criminosa brasileira. Nesse mega-assalto, em abril de 2017, o grupo conseguiu levar mais de R$ 47 milhões da Prosegur. Desses, apenas R$ 4 milhões foram recuperados.

Busca pela aprovação da lei
Apesar da sofisticação, dos recursos milionários e da tecnologia empregada, o domínio de cidades ainda não é um crime tipificado em lei, conforme explicou Hélio Freitas, vice-presidente da Sinpef/ES (Sindicato dos Policiais Federais do Estado do Espírito Santo) e membro do Conselho da Fenapef (Federação Nacional dos Policiais Federais). Até o momento, há apenas um projeto de lei (número 5.365/2020) em trâmite no Senado. “É necessário inserir um novo artigo na lei que reconheça o domínio de cidades como um delito maior do que crimes contra o patrimônio”, disse.

O vice-presidente da Sinpef/ES defende a necessidade de reconhecimento da modalidade como crime hediondo. Sem essa tipificação, Freitas diz que os grupos que conduzem essas ações afrontam e desafiam as forças de segurança.

Hoje, o criminoso que comete essas ações, explica o professor Matias, responde por roubo. No caso da aprovação da lei, ele responderá pelo crime de domínio de cidades com um aumento considerável da pena. A proposta legislativa inclui ainda a criminalização do ato preparatório para a ação. No roubo, essa etapa não é considerada crime, explica ele.

Sem o planejamento estratégico e uma integração entre as polícias, a modalidade domínio de cidades impõe riscos a moradores das cidades e à polícia. Para Matias, o enfrentamento dessas ações sem um plano de defesa pode ser considerado “quase um suicídio”. Isso porque os recursos utilizados pelos criminosos e o plano prévio para a realização do crime bloqueiam as ações policiais convencionais. Hoje, segundo Matias, a corporação busca rever procedimentos para grupos especializados contra o domínio de cidades. “É um desafio a ser superado”, disse.

Nessas ações, agentes e civis correm riscos devido à violência empregada pelos grupos. Moradores das cidades em que ocorrem os ataques podem ser utilizados como escudos humanos, como ocorreu em Araçatuba (SP), onde pessoas foram colocadas sobre os carros para que a polícia não atirasse, ou em Guarapuava, quando fizeram um cordão humano para blindar a empresa atacada. “A melhor forma de combater ações de domínio de cidades são os planos de defesa previamente elaborados e simulados”, afirmou o professor.

Diferença entre ‘novo cangaço’ e ‘domínio de cidades’
Especialista em crimes contra o patrimônio, Ricardo Matias explicou a diferença entre os atos infracionais denominados novo cangaço e domínio de cidades. Segundo ele, o novo cangaço visa cidades pequenas e, geralmente, bancos para serem roubados. Já o domínio de cidades, além de ser uma nova modalidade de crime contra o patrimônio, é uma forma de agir para outros atos criminais, como resgate de presos.

“O domínio de cidades é um crime complexo e muito mais elaborado, que independe do tamanho dos municípios”, afirmou.

De acordo com o professor, muitos ainda confundem furtos com explosivos a caixas eletrônicos com ações do novo cangaço ou domínio de cidades, mas distinguir modalidades de crime é importante para pensar em políticas de segurança pública em diferentes municípios e, com isso, segundo ele, proteger vidas.

Fonte: Com informações da Agência Estado

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