Erro técnico faz TJ-SP anular condenação de presidente de órgão de proteção ao patrimônio de SP por improbidade

Um erro burocrático fez o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) anular a condenação do atual presidente do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado (Condephaat), Carlos Augusto Faggin, por improbidade administrativa.

Além de Faggin, o prefeito de Guarulhos, Gustavo Henric Costa, o Guti (PSD), 24 vereadores, servidores públicos e empresários envolvidos no caso também terão a chance de se defender da acusação em um novo julgamento.

Os réus são acusados de improbidade administrativa pelo destombamento e a demolição de um casarão histórico em Guarulhos.

O cartório da 1ª Vara da Fazenda Pública de Guarulhos, no entanto, deixou de intimar alguns vereadores para que eles pudessem apresentar sua defesa. O juiz do caso acolheu o argumento de que esses réus não tiveram direito à ampla defesa e anulou a condenação de todos os envolvidos.

Os advogados das partes têm 15 dias para apresentar suas contrarrazões, que serão reanalisados pelo tribunal.

Entenda o caso
Além de Faggin e de Guti, também foram condenados o ex-prefeito Sebastião de Almeida (Solidariedade), servidores públicos e parlamentares que votaram a favor do projeto de destombamento — Guti, à época, era vereador na cidade. No total, foram condenadas duas empresas e 39 pessoas físicas.

Todos os envolvidos atuaram no processo de destombamento do Casarão Saraceni, um dos raros imóveis que contavam a história da imigração italiana em Guarulhos, o segundo maior município do estado de São Paulo;
Os desembargadores determinaram que os condenados percam as funções públicas e os direitos políticos por três anos;
Eles ainda deverão pagar uma multa de cinco vezes o valor do último salário recebido como agente público;
O imóvel, que ficava no estacionamento do Internacional Shopping Guarulhos, foi tombado em 2000 como patrimônio do município;
Mas em 2010, com base em um documento assinado por Carlos Augusto Faggin, ele foi destombado com autorização da Câmara Municipal e da prefeitura.
À época, Faggin ainda era conselheiro do órgão estadual de defesa do patrimônio.

Com esse documento, o vereador Geraldo Celestino encaminhou um projeto para revogar a proteção ao imóvel. Assim que o imóvel deixou de ser protegido, começou a ser demolido. (veja o antes e depois abaixo)

No lugar do casarão, o shopping, dono do terreno, construiu mais vagas para carros, mas a mudança na paisagem logo entrou na mira do Ministério Público.

“O tribunal considerou como um ato de improbidade, ou seja, um ato de corrupção, algo grave, uma conduta realmente preocupante, que tem consequências bem pesadas no Direito”, explicou Marcelo Figueiredo, advogado e professor de Direito Constitucional da PUC-SP.

Ação Civil do Ministério Público
O processo de destombamento foi alvo de Ação Civil Pública promovida pelo Ministério Público. O órgão apontou que a proposta “não traz qualquer benefício à coletividade. Apenas visa beneficiar economicamente as empresas que exploram o Internacional Shopping de Guarulhos, que tinham a nítida intenção de ampliação de seu estacionamento”.

As defesas dos condenados pediram mais explicações ao Tribunal de Justiça. Por isso, as penas ainda não podem ser cumpridas.

“Falta o julgamento de um recurso chamado embargos de declaração. Essa decisão não é leve, é uma pena pesada, que vai atingir não só o bolso das pessoas, como também a reputação das pessoas condenadas”, destacou o professor Marcelo Figueiredo.

Casos semelhantes
O Ministério Público acompanha outros dois casos com procedimentos semelhantes.

Em fevereiro, o SP2 mostrou que o Conpresp (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio de São Paulo) decidiu não estudar o tombamento de um casarão demolido nos Jardins, na Zona Oeste da capital, com base em um laudo apresentado pela construtora interessada no terreno.

O documento, que dizia que o imóvel não tinha relevância histórica, também foi assinado por Carlos Augusto Faggin, que disse que o imóvel não tinha relevância histórica.

Faggin também assinou o Plano Diretor da Fundação Butantan, que prevê a construção de um complexo industrial para a produção de vacinas na área tombada como patrimônio histórico e ambiental.

O escritório de arquitetura de Faggin recebeu mais de R$ 1 milhão para fazer o projeto do Butantan, que já foi aprovado pelo Condephaat, ou seja, o órgão que ele mesmo preside desde 2017.

“Na minha visão, sem dúvida, existe um conflito de interesse. Como que ele pode, numa instituição como o Condephaat, que é um órgão de proteção do patrimônio e do interesse público, ao mesmo tempo ser proponente desse projeto?”, questionou Sonia Imperio Hamburguer, economista e participante do coletivo Rede Butantan.

O que dizem os envolvidos
A defesa de Carlos Augusto Faggin informou que o arquiteto apenas elaborou parecer técnico sobre as características arquitetônicas e históricas da Casa Saraceni e que esse parecer tinha como objetivo informar e sugerir providências à administração pública. A defesa do arquiteto ressaltou, ainda, que ele não se tornou réu nesta ação por ser presidente do Condephaat, mas por ter elaborado o documento.

A Secretaria Estadual de Cultura, responsável pelo Condephaat, disse que não existe impedimento legal para que Carlos Augusto Faggin ocupe o cargo. A pasta também afirmou que todos os conselheiros têm autonomia para elaborar pareceres técnicos e participar de projetos com suas empresas ou como pessoa física, desde que não exista relação direta com o conselho.

Guti, atual prefeito de Guarulhos, considerou a decisão equivocada e disse que vai recorrer.

O Internacional Shopping de Guarulhos informou que não tem conhecimento do processo e que a área onde estava o casarão não pertence ao shopping desde 2022.

A TV Globo não conseguiu contato com o ex-prefeito Sebastião de Almeida nem com o vereador Geraldo Celestino.

A Fundação Butantan informou que Faggin não desempenha nenhuma atividade para o instituto desde fevereiro de 2023. Disse também que o projeto de consultoria para ampliação do espaço, iniciado em 2018, foi encerrado.

Fonte: G1

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