O Ministério Público Federal (MPF) entrou com uma ação na Justiça para que o Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp) seja condenado a pagar R$ 500 mil em indenização por danos morais por abuso de autoridade contra os médicos que realizaram aborto legal em hospitais de São Paulo.
O valor é em indenização coletiva para os médicos e as pacientes.
A ação é em razão dos procedimentos disciplinares que o Cremesp abriu contra médicos que realizaram o procedimento de aborto legal no hospital Vila Nova Cachoerinha em mulheres vítimas de estupro. Segundo a ação, eles foram ameaçados de terem seus registros cassados.
Em abril, a colunista Mônica Bergamo, da “Folha de S.Paulo”, denunciou o caso. Segundo ela, integrantes do Cremesp alegaram que os profissionais teriam praticado tortura, tratamento cruel, negligência, imprudência e até mesmo o assassinato de fetos —ainda que embriões não tenham direitos previstos pela Constituição.
De acordo com o MPF, o Cremesp efetuou uma vistoria no hospital, em dezembro de 2023, e requisitou os prontuários de mulheres que haviam se submetido ao procedimento nos dois meses anteriores.
Para o órgão, o Cremesp cometeu abuso de autoridade e “afronta ao devido processo administrativo”.
Ana Letícia Absy, procuradora regional dos Direitos do Cidadão em São Paulo e autora da ação, o Cremesp gerou um “dano moral indiscutível”.
O g1 pediu uma posição do Cremesp sobre a ação, mas não teve retorno até a publicação desta reportagem.
Em 3 de dezembro, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), deu o prazo de cinco dias para a prefeitura e o governo de São Paulo responderem se tiveram acesso aos prontuários de pacientes que realizaram aborto nos hospitais da capital. Ele também questionou se os dados foram passados para o Cremesp.
Na decisão, o ministro diz que ,”caso os dados não tenham sido compartilhados, ficam os entes cientificados, desde logo, sobre a proibição de fornecerem dados pessoais constantes de prontuários médicos de pacientes que realizaram aborto legal”.
Há mais de um ano o serviço de aborto legal vem sendo uma questão para a Prefeitura de SP. Em dezembro de 2023, o serviço foi suspenso no Hospital Vila Nova Cachoeirinha, que era referência neste tipo de atendimento. Houve diversas ações na Justiça para a prefeitura voltar a oferecer o serviço, no entanto, em fevereiro deste ano, a gestão de Ricardo Nunes (MDB) conseguiu uma liminar para manter o aborto legal suspenso.
Acesso aos prontuários
Em março, a prefeitura passou a ser investigada pela Polícia Civil por ter acessado prontuários de pacientes que fizeram aborto legal no Vila Nova Cachoeirinha. A gestão não tinha autorização para acessar os dados das pacientes, e a polícia investiga se houve violação do sigilo profissional.
Em janeiro, o secretário da Saúde, Luiz Carlos Zamarco, chegou a admitir que os dados tinham sido copiados. Segundo apuração do SP2, funcionários do hospital foram obrigados, por ordem da secretaria, a acessar prontuários de pacientes que fizeram aborto legal no Vila nova Cachoeirinha. Os dados seriam repassados para a pasta.
Médicas afastadas
Em abril, médicas que realizaram o procedimento de aborto legal tinha sido afastadas pela Cremesp.
O conselho do órgão já tinha votado pela interdição cautelar de duas médicas. Na época, questionado pelo g1 se médicos foram afastados, o Cremesp afirmou apenas que estava “apurando os fatos”.
Aborto legal
O aborto legal é um procedimento de interrupção de gestação autorizado pela legislação brasileira e que deve ser oferecido gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
É permitido nos casos em que a gravidez é decorrente de estupro, quando há risco à vida da gestante ou quando há um diagnóstico de anencefalia do feto. Além do Hospital Vila Nova Cachoeirinha, outros quatro hospitais também realizam aborto legal na capital paulista:
- Hospital Municipal Dr. Cármino Caricchio (Tatuapé);
- Hospital Municipal Dr. Fernando Mauro Pires da Rocha (Campo Limpo);
- Hospital Municipal Tide Setúbal (São Miguel);
- Hospital Municipal e Maternidade Mário Degni (Jardim Sarah).
Fonte: G1