‘Passei a vida tentando agradar minha mãe. Só depois do Alzheimer ela conseguiu dizer que me ama’

Quando sua mãe foi diagnosticada com Alzheimer, em 2010, a carioca Claudia Alves, na época uma corretora de imóveis de 48 anos, achou que estava diante do pior desafio da sua vida. Naquela dor, no entanto, surgiria a chance de reconstruir a relação fria com a mãe, a trajetória profissional e até a forma de cuidar de si mesma.

Hoje, aos 63 anos, Alves tem hoje 1,2 milhão de seguidores no Instagram e acaba de lançar o livro O Bom do Alzheimer (Ed. Sextante, 192 págs., R$ 49,90), no qual narra essa reviravolta.

Uma infância marcada pela ausência de afeto
A carioca cresceu sem abraços, beijos e palavras de amor. “A frieza era comigo, porque a minha mãe sempre foi mais distante de mim do que o meu irmão. Com ele, ela era mais amorosa, até porque ele era mais insistente na busca do afeto”, relembra.

Quando tinha 12 anos, seu irmão, Rogério, morreu, aos 14. A partir dali, a relação com a mãe se tornou ainda mais difícil. “Ela ficou cada vez mais fria comigo. Um dia eu explodi e falei: ‘O filho preferido foi embora. Só restou eu. Se você não me quer, vai ter que me engolir’”, conta.

Oito anos após a morte de Rogério, Euclice ficou viúva, e a filha entendeu que deveria assumir a responsabilidade pelo cuidado da mãe. Apesar de estarem sempre juntas, o vínculo não se modificou. Alves não tinha expectativa de que a distância emocional um dia se encurtasse.

A chegada da demência
Os anos passaram. Alves trabalhava como corretora de imóveis de alto padrão e mal parava em casa. Mas um problema de saúde a obrigou a ficar um mês afastada. Durante a pausa, ela percebeu o quanto a mãe, que morava com ela, estava ainda mais solitária, deprimida e fechada. Veio, então, o diagnóstico de Alzheimer.

A filha poderia ter contratado ajuda profissional, mas decidiu ela mesma assumir os cuidados com a mãe. O primeiro passo foi incluir Euclice nas tarefas cotidianas, como idas ao supermercado, à farmácia, à praia. De natureza introspectiva e melancólica, a mãe começou a cantar, dançar, gargalhar e parou até de tomar antidepressivo. Mesmo com Alzheimer, estava feliz.

O papel da comunicação no cuidado de uma pessoa com Alzheimer
O processo, no entanto, não foi simples. Com erros e acertos, Alves aprendeu que a forma de falar influenciava a reação da mãe. Um dos episódios mais marcantes foi quando a encontrou lavando o rosto com a água do vaso sanitário. Desesperada, tentou obrigá-la a tomar banho, chamou atenção, falou alto, e foi empurrada.

“Entrei em pânico. Me joguei no chão, querendo provocar alguma reação. Ela passou por cima de mim e foi ver TV. Fiquei ali, chorando, sem saber o que fazer”, rememora.

Minutos depois, a mãe estava cantando e rindo na sala, como se nada tivesse acontecido. Foi então que a filha teve um insight. Enquanto Euclice nem sequer se lembrava do que tinha acontecido, ela remoía o episódio. Alves decidiu, então, mudar a forma de falar. Propôs que elas saíssem para tomar um sorvete, porque estava calor. A mãe topou. “Falei que a gente ia escolher uma roupa nova, tomar banho e sair. E funcionou”, conta.

A carioca começou a registrar, num diário, o que dava certo e o que dava errado. Após seis anos de experiência, passou a dividir essas experiências nas redes sociais, e os vídeos viralizaram. Formou-se em gerontologia e, em 2020, criou um curso digital para quem cuida de pessoas com demência. Segundo ela, mais de 7 mil pessoas já fizeram as aulas. O conteúdo que ela buscou lá atrás, e não encontrou, hoje ela mesma produz.

O alerta do próprio corpo
Durante mais de dez anos, Alves se dedicou exclusivamente à mãe, e se esqueceu de si — uma trajetória comum a muitos cuidadores. Aos 60 anos, numa viagem com amigas ao Nordeste, percebeu que não tinha mais fôlego para subir ladeiras. Desde então, decidiu se cuidar e perdeu 15 quilos.

“Antes, quando me perguntavam se eu tinha medo de ter Alzheimer, eu dizia: isso é problema dos meus filhos. Hoje eu vejo que é meu problema também. Eu quero envelhecer com saúde e lucidez. Tenho projetos, quero continuar ajudando quem cuida”, diz.

A gerontóloga não tem dúvidas de que a mãe segue sendo ela mesma, apesar da doença: “Ela fala pouco, mas ainda tem personalidade forte. Me belisca, manda calar a boca. É a mesma pessoa, só que com outra forma de demonstrar amor”.

Fonte: revistamarieclaire

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