Policiais e câmeras dão sensação de segurança, mas não evitam ataques a escolas, dizem especialistas

por Redação

Após os ataques à Escola Estadual Thomázia Montoro, em São Paulo, e à creche Cantinho do Bom Pastor, em Blumenau (SC), uma onda de ameaças a outras instituições de ensino despontou ao longo das duas últimas semanas. Diante desse cenário, governos e prefeituras vêm anunciando uma série de medidas para reforçar a segurança, como o aumento de rondas escolares pela Polícia Militar, a presença de agentes das unidades e a instalação de câmeras de segurança.

Para psicólogas ouvidas pelo R7, inicialmente, a presença dos policiais e dos equipamentos de monitoramento são ferramentas que trazem a sensação de segurança aos alunos e familiares. Entretanto, integrantes do Instituto Sou da Paz afirmam que o investimento exclusivo nessa área não previne episódios futuros de violência.

Os especialistas afirmam que essa onda de violência entre os jovens é uma questão complexa e é reflexo de uma gama de fatores, como o bullying, os efeitos pós-pandemia e os grupos extremistas que incentivam o ódio nas redes sociais. Por isso, é essencial o trabalho integrado das áreas de educação, saúde, assistência social e segurança.

Presença de policiais
Há anos, a psicóloga especialista em luto e coordenadora do Niped (Núcleo de Intervenções Psicológicas em Emergências e Desastres) Elaine Alves tem atuado em instituições que foram alvo de ataques, como a Escola Estadual Primo Bitti, em Aracruz (ES), e a Escola Estadual Professor Raul Brasil, em Suzano (SP).

Atualmente, Alves presta atendimento na escola da zona oeste de São Paulo onde uma professora foi assassinada a facadas e quatro pessoas ficaram feridas em 27 de março. “O que eu tenho observado na Thomázia é que os pais e alunos se sentem mais seguros [com a presença dos policiais]. Eles não se intimidam. Também estive presente na Raul Brasil e em Aracruz e em nenhuma delas eu senti que a polícia intimidava”, relata a psicóloga.

Entretanto, a profissional faz uma ressalva. “[A presença dos policiais] não tira o medo dos alunos de que os ataques continuem ou o medo de ir à escola. Isso vem se acentuando cada dia mais com relação às [novas] ameaças. São sintomas de estresse pós-traumático que são normais e esperados após um evento extremo”, explica Alves.

A doutora em psicologia clínica pela USP (Universidade de São Paulo) Joana Vartanian corrobora a opinião da coordenadora do Niped. “Eu acredito que seja natural que os pais, a sociedade e as escolas coloquem muitas esperanças em estratégias de segurança, em colocar câmeras de seguranças e vigias. Faz sentido do ponto de vista psicológico, porque a gente quer se sentir seguro depois de ataques como esses.”

Contudo, Vartanian afirma que, do ponto de vista prático, não há nenhum estudo científico que comprove a relação entre o aumento de investimento nessas medidas de segurança — policiamento e instalação de câmeras — com a prevenção de ataques em escolas.

Em nota, o Instituto Sou da Paz, referência em estudos de segurança pública, afirma que “evidências mostram que as iniciativas que direcionam investimento apenas em mais segurança dentro das escolas não funcionam”. A instituição cita como exemplo o massacre de Columbine, em 1999, que terminou com 15 pessoas mortas.

“A partir dele, o país realizou uma série de medidas, como colocar detector de metais, portas reforçadas e câmeras de segurança com reconhecimento facial, além de policiais armados em escolas, mas elas não foram suficientes para diminuir o número de casos violentos”, diz o documento.

Críticas
A coordenadora de projetos do Instituto Sou da Paz Danielle Tsuchida explica que o investimento dos governos e das prefeituras deve estar focado em duas diretrizes: o policiamento da ronda escolar com foco na saída e entrada dos estudantes e fortalecimento com a comunidade escolar e a inteligência policial na apuração de eventuais denúncias pelas plataformas digitais.

“A presença da arma no ambiente escolar pode gerar tensão nos estudantes e nos professores. Para alguns, infelizmente, a polícia não é sinônimo de proteção”, afirma Tsuchida.

À reportagem, um professor de uma escola estadual da região da Vila Sônia, zona oeste da capital paulista, que prefere não ser identificado, conta que a comunidade escolar costuma ter medo dos policiais militares.

“Eu leciono em um bairro periférico. Quando se fala do aumento da presença da polícia nas escolas, [a medida] dá medo na comunidade. A realidade deles é de muita violência”, denuncia. O docente também relata que antes de colocar mais agentes na porta dos colégios, há outras áreas precisando de investimentos.

“Em algumas salas na minha escola, há lâmpadas que estão queimadas, você leciona no escuro. Também não tem mais biblioteca. Virou um carrinho de supermercado que passa uma vez por semana pelos corredores”, exemplica o professor.

O caminho a ser trilhado pelas escolas é o desenvolvimento da cultura de paz por meio do combate ao bullying, do respeito à diversidade, da resolução de conflitos de forma restaurativa e não punitiva, afirma Tsuchida.

“A escola deve ser não só um espaço de aprendizado, mas de acolhimento e de escuta dos jovens. A educação sozinha não vai dar conta”, finaliza a coordenadora de projetos do Instituto Sou da Paz.

Fonte: r7

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