Vítima de Tráfico Humano ‘Se acontecer algo comigo, saiba que tentei ao máximo’, escreveu brasileiro vítima de tráfico humano ao pai antes de fugir de máfia em Mianmar Redação12 de fevereiro de 2025035 visualizações O brasileiro Phelipe de Moura Ferreira, de 26 anos e que foi resgatado depois de fugir da área onde estava sendo mantido refém por uma máfia de golpes cibernéticos em Mianmar, no Sudeste Asiático, chegou a avisar o pai que tentaria a fuga no último sábado (8). Nas mensagens, as quais o g1 teve acesso, ele contou que ia cruzar um rio com outras 85 pessoas e correr por dois quilômetros. Phelipe pediu orações para a família e ainda se despediu caso algo acontecesse com ele. O pai de Phelipe, Antônio Carlos Ferreira, contou ao g1 que o filho conseguiu enviar mensagens por um número desconhecido em um momento que ninguém da máfia o estava o monitorando. “Ele me avisou sobre a fuga e a ONG também. Estavamos só na expectativa e graças a Deus o meu filho foi resgatado. Estou muito feliz, muito feliz mesmo. Você não sabe o que estou sentido neste momento”, disse Antônio. Além de Phelipe, o brasileiro Luckas Viana dos Santos, de 31 anos, também foi resgatado com a ajuda da ONG internacional “The Exodus Road” depois de fugir do local. O Fantástico mostrou o caso de Luckas e Phelipe, que são da capital paulista, em dezembro do ano passado. Os dois aceitaram promessas falsas de emprego e acabaram sendo vítimas de tráfico humano em KK Park, em Mianmar. O local é considerado uma “fábrica de golpes online” e ambos foram escravizados para aplicarem golpes (veja mais abaixo). “Graças a Deus ele foi resgatado. Agora temos uma outra etapa, porque a gente precisa de ajuda das autoridades para novos passaportes. Eles fugiram e receberam a ajuda da ONG pra conseguirem sair de novo da máfia, mas eles não têm passaporte e eles não podem ficar como ilegais no país”, afirmou Cleide Viana, mãe de Luckas. Como foi a fuga e o resgatePhelipe e Luckas conseguiram fugir entre a noite de sábado (8) e madrugada de domingo (9) com centenas de imigrantes, e foram detidos por agentes do DKBA (Exército Democrático Karen Budista). Na sequência, eles foram levados para um centro de detenção da DKB, que fica em Mianmar, onde devem esperar a transferência para Tailândia. Ao g1, Cíntia Meirelles, diretora da ONG The Exodus Road, explicou que a fuga foi combinada pelos reféns, que conseguiram avisar familiares e ativistas sem que fossem descobertos pelos mafiosos, que monitoravam tudo. Como a ONG estava em diálogo com representantes do governo da Tailândia para que 361 imigrantes fossem libertados de Mianmar, Phelipe e Luckas acabaram sendo incluídos nessa lista. “Eles planejaram uma fuga que iria acontecer no sábado para domingo. Mas foi feita uma reunião dia 15 de janeiro, onde tinham todas as representações das forças armadas, das polícias de lá, que é a DKBA [Exército Democrático Karen Budista], junto com a máfia chinesa, junto com o governo de Mianmar. Fizemos um acordo em que eles libertariam 371 vítimas de tráfico de pessoas. Nós conseguimos incluir o nome do Lucas e do Felipe nessa lista”, afirmou. “Essa operação da DKBA [que deteve os brasileiros] é uma operação pontual em que eles vão libertar essas 371 vítimas. Então, com a fuga, eles já estavam nessa lista”, explicou. Ainda conforme Cintia, os dois estão no centro da DKBA, que fica em Myanmar, e nesta quarta-feira (12) irão para a Tailândia. “Chegando na Tailândia, os brasileiros vão ficar em um centro de detenção onde eles irão verificar se de fato são vítimas ou não. No caso deles, a gente já tem toda a documentação. É um procedimento legal e em 15 dias eles serão liberados. Tendo a liberação, eles vão ser encaminhados para a embaixada que deve, aí sim, cumprir o repatriamento que foi já solicitado pela dona Cleide e pelo senhor Antônio junto a DPU, que é a carta de hipossuficiência com pedidos de repatriamento de vítimas de tráfico no exterior”, ressaltou. Em nota, o Itamaraty informou que tomou conhecimento do caso “com grande satisfação, da liberação de dois brasileiros vítimas de tráfico de pessoas na fronteira entre Myanmar e Tailândia”. “O Itamaraty, por meio de suas Embaixadas em Yangon, no Myanmar, e em Bangkok, na Tailândia, vinha solicitando os esforços das autoridades competentes, desde outubro do ano passado, para a liberação dos nacionais. O tema foi também tratado pela Embaixadora Maria Laura da Rocha, na ocasião na qualidade de Ministra substituta, durante a IV Sessão de Consultas Políticas Brasil-Myanmar, realizada em Brasília, em 28 de janeiro último. Em suas gestões, a Embaixadora Maria Laura da Rocha reforçou a necessidade de esforços contínuos para localizá-los e resgatá-los”, afirmou. O Itamaraty também afirmou que o setor consular manteve, ainda, contato permanente com as famílias. Entenda o casoEm entrevista ao Fantástico em dezembro de 2024, Cleide Viana contou que tudo começou quando o filho Luckas, que tem conhecidos na Ásia, recebeu uma proposta para trabalhar em um cassino nas Filipinas. A proposta veio de um amigo dele que morava na região. Contudo, quando o cassino fechou, ele não tinha dinheiro para voltar ao Brasil. Então, recebeu pelo Telegram o convite para trabalhar num hostel na Tailândia, mas se tornou refém de uma máfia. “Ele falou que ia para Tailândia que lá era mais barato e que o dinheiro que tinha dava pra ir pra lá. Estranhei o primeiro telefonema porque ele disse que não estava bem”, afirmou. Também pelo Telegram, Phelipe de Moura Ferreira recebeu proposta de trabalho numa central telefônica na Tailândia e topou. Após aceitar a proposta, ele desapareceu. Dias depois conseguiu entrar em contato com a família rapidamente pelo computador da empresa quando não tinha ninguém por perto, o monitorando. Passaportes e celulares foram apreendidos. O jovem relatou que foi aprisionado por uma máfia de golpes cibernéticos. “Um dos chefes disse que eu precisava trazer resultado para a empresa. Senão eu iria ser agredido até sexta-feira, que é amanhã. A gente tá fazendo tudo para tentar se manter vivo”, disse Phelipe, em mensagem enviada para o pai no ano passado. Mianmar é um país em guerra civil desde 2021. O caos abriu espaço para criminosos internacionais se instalarem no país, segundo especialistas. Em 2023, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos afirmou que ao menos 120 mil pessoas, do mundo todo, estariam sendo mantidas nessa região em Mianmar, passando cerca de 18 horas por dia atrás de vítimas, às vezes, conhecidas. “Muitas vezes uma vítima, quando chega ao local é explorada, é forçada a recrutar novos brasileiros”, explica Eduardo Bomfim, delegado da Polícia Federal. Fonte: G1