Um mês após o início do passe livre nos ônibus de São Caetano do Sul, na região metropolitana de São Paulo, o número de usuários do sistema dobrou.
Em média, eram 25 mil pessoas transportadas diariamente até 1° de novembro, quando o programa entrou em vigor. Um mês depois, segundo os primeiros dados consolidados, o número de usuários diários passou para 52 mil.
São Caetano do Sul passou, então, a ser o município mais populoso do estado – são 165 mil habitantes – a adotar o passe livre pleno no transporte público.
Os impactos na cidade já são visíveis, a começar pela queda no número de remarcações de consultas no SUS (Sistema Único de Saúde) e pela diminuição da fila dos carros de aplicativos no terminal rodoviário.
Dinheiro economizado
“Hoje mesmo, minha filha vinha para a escola e eu falei: vamos de ônibus. Dispensei a perua, vamos de ônibus, aproveitar, né?”, contou o comerciante José Ednaldo de Santos, de 63 anos, que tem uma banca de produtos eletrônicos no terminal rodoviário.
O dinheiro economizado com as passagens agora tem outra finalidade. “Serve para comprar mistura, pagar algumas coisas, fatura do cartão, boleto, água, luz.”
O prefeito da cidade, José Auricchio Júnior, elenca as vantagens econômicas que o programa está gerando ao município, mas, antes, defende o Tarifa Zero como direito social.
“Eu sempre tive uma tendência de achar que o transporte público é quase que um dever do Estado. Como você tem saúde, como tem educação”, afirmou.
Do ponto de vista econômico, a previsão do prefeito é que a gratuidade no transporte comece a apresentar resultados mais visíveis em 2024, principalmente no comércio.
“Eu deixo de pagar passagem ida e volta, são R$ 10. Eu como um lanche, vou ao açougue, vou gastar no comércio. No final da semana, eu economizei R$ 60, R$ 70, o que me permite sair com a minha família”, destaca o prefeito.
Auricchio chama a atenção para a desoneração das empresas instaladas na cidade com a gratuidade dos ônibus. Com o passe livre, os empresários deixaram de ter de pagar o vale-transporte.
“Esse pequeno comerciante, pequeno empresário, quando tiver que contratar o próximo funcionário para a empresa dele, vai querer o cara morando onde? Aqui. Então, acho que tem um ciclo virtuoso aí”, acrescenta.
Fundo de apoio
O primeiro mês de Tarifa Zero custou cerca de R$ 2,9 milhões à prefeitura — a cidade tem oito linhas de ônibus que são operadas com 54 veículos pela única concessionária, a Viação Padre Eustáquio. A execução do programa no período de um ano deverá custar R$ 35 milhões, o que corresponderá a 1,5% do orçamento total do município previsto para 2024 (R$ 2,434 bilhões).
Os recursos, segundo a administração municipal, já estão garantidos e não será necessária a criação de novos impostos ou taxas.
O programa é bancado pelo Fundo de Apoio ao Transporte (Fatran) da prefeitura, composto por recursos de multas de trânsito, ações publicitárias envolvendo o sistema de transporte e dotações orçamentárias próprias de fontes relacionadas à mobilidade urbana e à sustentabilidade socioambiental.
“Nós já tínhamos um sistema relativamente bem gerido e ocioso. Ele tinha espaço, cabia um espaço nele para a gente trazer passageiro novo para dentro do sistema sem onerar”, ressalta o prefeito.
São Caetano do Sul é a oitava cidade paulista a adotar o sistema de passe livre pleno em 2023, ao lado de Porto Feliz, Piedade, Santa Isabel, Jales, Tietê, Ibaté e Nazaré Paulista.
O movimento no sentido da tarifa zero no transporte coletivo não é apenas paulista. Das 89 cidades que têm o passe livre pleno, 27 adotaram o sistema em 2023.
Uma característica comum entre esses municípios é a diminuição do número de passageiros nos últimos anos e a consequente redução dos recursos oriundos da cobrança da passagem.
“Em São Caetano, era um mergulho [a queda no número de passageiros], porque parece que não, mas a passagem impacta na vida das pessoas. E não adianta a gente olhar só para aqueles que tinham a gratuidade, que no nosso caso eram os idosos, gestantes, deficientes, e o passe escolar. Você tem o trabalhador informal, porque o trabalhador formal tem o VT, mas o informal e o desempregado não”, pondera Auricchio.
Segundo o pesquisador da Universidade de São Paulo Daniel Santini, o movimento em direção ao passe livre está relacionado a uma crise no sistema de financiamento de transporte com cobrança de passagens.
Ele diz que, com o encolhimento do número de pessoas transportadas, torna-se mais difícil o equilíbrio financeiro a partir da receita da catraca.
“A gente tem aí um horizonte que é muito preocupante para a sobrevivência e a continuidade do transporte público. Esse é o principal fator que explica por que estão sendo estudadas e testadas novas possibilidades de financiamento e organização”, diz.
Fonte: r7