Tribunal de Contas de SP analisa em caráter emergencial novo edital de câmeras corporais da PM após denúncia pedir suspensão

O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo analisa em caráter emergencial o novo edital para a contratação de 12 mil câmeras corporais para a Polícia Militar. A proposta foi lançada pela gestão de Tarcísio de Freitas (Republicanos) no dia 22 de maio.

Atualmente, são 10.125 câmeras em operação no estado que foram compradas por meio de dois contratos. Todas elas serão substituídas pelos novos equipamentos e 2 mil novas serão compradas.

Segundo o edital, a gravação de vídeos pelo equipamento deverá ser realizada de forma intencional, ou seja, o policial será responsável por gravar ou não uma ocorrência, como mostraram o g1 e a GloboNews. Com isso, entidades ligadas à segurança pública manifestaram preocupação.

Ao g1, o TCE informou que a análise está sendo feita depois que uma representação de autoria da vereadora Elaine Cristina Mineiro (PSOL) foi encaminhada no dia 29 de maio pedindo a suspensão do certame.

A denúncia da vereadora aponta que a escolha da modalidade licitatória, por pregão eletrônico, é equivocada. Além disso, questiona o “orçamento sob sigilo” e afirma que há “iminente violação de direitos humanos e individuais pelo uso do reconhecimento facial”.

No mesmo dia, a presidência do TCE acatou a representação e sorteou um conselheiro relator que analisará os autos com urgência, uma vez que a sessão pública da licitação está prevista para ocorrer no dia 10 de junho.

“A representação, se considerada procedente pelo relator, será avaliada pelo plenário em sede de exame prévio de edital. Caso haja novas representações, serão analisadas em conjunto pelo relator designado”, diz o órgão.

Ainda conforme o Tribunal de Contas, representações opostas contra editais lançados no mercado podem ser feitas por qualquer pessoa, partido político, associação ou sindicato, e apresentadas na forma de denúncias por ilegalidades ou irregularidades cometidas contra a probidade administrativa em órgãos da administração pública.

Após a análise prévia do edital, ele pode ser liberado caso a representação seja considerada improcedente ou suspenso, retificado e paralisado se a representação for analisada como procedente ou parcialmente procedente.

Em nota, o governo de SP afirmou que, assim que for notificado formalmente, prestará os esclarecimentos ao Tribunal de Contas do Estado (TCE).

Além disso, ressaltou que o edital para a contratação de 12 mil novas câmeras corporais portáteis cumpre rigorosamente a legislação vigente.

“Desenvolvido a partir de consultoria com o Gartner Group, o edital prevê um aumento de 18,5% no número de câmeras corporais, além da modernização dos equipamentos com a inclusão de novas funcionalidades para apoiar o trabalho policial. A modelagem está em conformidade com as diretrizes estabelecidas pela Portaria nº 648/2024 do Ministério da Justiça e Segurança Pública, incluindo o tempo de armazenamento das imagens que permanece em 365 dias”, diz a nota.

Pedido de mudanças no edital

Segundo o edital, a gravação de vídeos pelo equipamento deverá ser realizada de forma intencional, ou seja, o policial será responsável pela escolha de gravar ou não uma ocorrência.

A captura de imagens também não será mais ininterrupta como ocorre atualmente. E na prática, a mudança pode dificultar investigações de atos de violência policial porque deixará a decisão sobre ligar ou não o equipamento a cargo dos agentes.

O procurador-geral da República, Paulo Gonet, pediu que o Supremo Tribunal Federal (STF) determine que governo de São Paulo altere o edital sobre a compra de câmeras corporais para a Polícia Militar.

Em parecer enviado ao Supremo nesta terça-feira (4), a PGR avalia que o estado de SP deve ajustar a exigência de tempo de armazenamento das imagens levando em consideração os prazos mínimos estabelecidos em portaria do Ministério da Justiça.

O texto indica prazo mínimo de noventa dias, como regra, e de um ano para gravações intencionais.

Para Gonet, a portaria do Ministério da Justiça não prevê, portanto, a necessidade de que as gravações sejam sempre feitas de forma ininterrupta.

O parecer da PGR responde a recurso da Defensoria Pública de São Paulo, e de outras organizações da sociedade civil ligadas à segurança pública, que acionaram o STF para solicitar revisão do novo edital de contratação de 12 mil câmeras.

Na petição da Defesa Civil, protocolada no dia 27 de maio, os defensores públicos do núcleo especializado de cidadania e direitos humanos reforçaram a preocupação com as mudanças e alertam para o risco de precarização do programa.

No documento, a Defensoria cobrou que o edital seja refeito e contenha:
Previsão de que as novas câmeras contratas serão destinadas, preferencialmente, às unidades e batalhões que realizam operações policiais;
Garantia de que o equipamento irá contemplar os dois tipos de gravações (automática e intencional);
Manutenção dos prazos previstos para o armazenamento das imagens, de acordo com os contratos vigentes, de 60 dias para as gravações de rotina e 365 dias para as gravações intencionais;
Requisitos claros para a habilitação técnica das empresas concorrentes.
Novo sistema de câmeras

Atualmente, há 10.125 câmeras em operação no estado que foram compradas por meio de dois contratos, e as gravações são divididas em duas categorias: de rotina e intencionais. Todas elas serão substituídas pelos novos equipamentos e 2 mil novas serão compradas.

Os vídeos de rotina registram todo o turno do policial e são obtidos sem o acionamento, portanto gravam de forma ininterrupta.

Atualmente, os PMs não têm autonomia para escolher o que desejam registrar. Tudo é gravado, ao menos em vídeo. O que eles podem fazer é acionar para ativar o som e melhorar a qualidade da imagem.

Já os vídeos intencionais são obtidos pelo acionamento proposital do policial e ficam guardados por um ano. Elas também possuem som ambiente e resolução superior às gravações de rotina.

No novo edital, não há menção às gravações rotineiras, somente às intencionais. O documento também informa que o acionamento para captura de imagens poderá ser feito de forma remota pelo Centro de Operações da Polícia Militar (Copom) ou pelo próprio policial.

Além disso, os vídeos serão transmitidos ao vivo (live streaming) pela internet para a central da corporação.

Requisitos para participação da licitação não estão claros
Na avaliação das organizações, os requisitos para habilitação técnica das empresas que desejarem participarem da licitação das câmeras corporais, especialmente quando comparado com os editais de 2020 e 2021, não estão claros.

O edital exige que, para participar do certame, as empresas devem comprovar a capacidade de fornecimento de apenas 500 “câmeras de vídeo”, o equivalente a 4% do total de equipamentos a serem contratados.

Entretanto, em 2020, exigiu-se das empresas concorrentes a comprovação de capacidade técnica de fornecimento de, no mínimo, 50% do objeto licitado.

O que diz o governo de SP
Em nota na época da divulgação do edital, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) informou que “o edital para a contratação de 12 mil novas câmeras operacionais portáteis (COPs) foi elaborado com base em rigorosos estudos técnicos.

“É importante reforçar que o acionamento das COPs é obrigatório e deverá ser feito pelo próprio policial ao iniciar uma ocorrência. Caso, por qualquer motivo, este acionamento não ocorra, o agente responsável pelo despacho da ocorrência no Copom (Centro de Operações da Polícia Militar) acionará a gravação remotamente. Toda ocorrência é comunicada de imediato ao Copom e essa inovação do acionamento à distância não desobriga os policiais a ligarem o equipamento durante as ações, mas oferece uma garantia adicional de que as COPs serão acionadas assim que o policial entrar em ação.”

Ainda de acordo com a pasta, o objetivo é garantir a ampliação das funcionalidades dos dispositivos e a alta qualidade de som e imagem captados.

“As novas câmeras contarão com um sistema de “buffer” capaz de armazenar imagens dos 90 segundos anteriores à ativação. Ou seja, as câmeras permanecem operando continuamente e, ao serem acionadas para armazenar imagens, elas incluirão gravações retroativas, possibilitando o registro completo da ocorrência.”

A Instituição alega que busca “exclusivamente o aperfeiçoamento do programa de câmeras operacionais portáteis e ressalta que os requisitos técnicos estabelecidos no edital permitirão que apenas empresas devidamente capacitadas forneçam os serviços à Corporação”.

Histórico
A implantação do programa de acoplar câmeras aos uniformes de policiais militares, batizado de “Olho Vivo”, começou em São Paulo em julho de 2020, com 30 aparelhos.

Em fevereiro de 2023, pouco depois de o atual governador Tarcísio de Freitas assumir o cargo, a PM paulista já tinha 10.125 câmeras à disposição.

No início do governo, Tarcísio, que se posicionou contrário às câmeras durante a campanha de 2022, chegou a dizer que estudava ampliar o programa.

O número, porém, permaneceu estagnado pelo menos até junho de 2023, segundo levantamento feito pelo g1.

Em outubro, o governador decidiu tirar R$ 15 milhões da verba destinada ao programa, um corte de cerca de 10% do valor total. Na época, a Secretaria de Segurança Pública (SSP-SP) alegou queda na arrecadação como justificativa.

Em setembro, uma ação civil pública pediu que a Justiça obrigasse o governo de São Paulo a instalar câmeras corporais nos policiais militares e civis que atuam na Operação Escudo, na Baixada Santista.

A Justiça de São Paulo chegou a atender o pedido da Defensoria Pública do Estado e do Ministério Público (MP-SP), mas a liminar foi suspensa no dia seguinte.

O caso foi parar no Supremo Tribunal Federal (STF) em dezembro do ano passado. Em março, o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do STF, deu prazo de 10 dias para que o estado de São Paulo se manifestasse diante de uma ação da Defensoria Pública, que pede o uso de câmeras corporais nas fardas da Polícia Militar.

O uso do equipamento nos uniformes da PM em SP evitou 104 mortes, segundo levantamento da FGV em dezembro de 2022 e a letalidade dos policiais em serviço foi a menor da história no ano passado, de acordo com um estudo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) em parceria com a Unicef divulgado em maio de 2023.

Fonte: G1

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