A cúpula da Polícia Civil de São Paulo antecipou para esta segunda-feira (22) uma reunião emergencial entre seus membros diretores para tratar da decisão do secretário da Segurança Pública (SSP), Guilherme Derrite, que na semana passada autorizou a Polícia Militar (PM) a registrar ocorrências de menor potencial ofensivo. Os registros seriam feitos em batalhões da PM.
O Conselho da Polícia Civil integra a cúpula da instituição. Ele é formado por delegados de primeira classe da polícia paulista, como diretores dos principais departamentos. O grupo pode discutir políticas de segurança institucional para a categoria.
O encontro estava marcado para quarta-feira (24). Segundo a SSP informou neste sábado (20) ao g1, a reunião foi antecipada devido a outro compromisso profissional do delegado-geral da Polícia Civil, Artur José Dian, “o que o impediria de participar no dia ordinário”. A pasta não respondeu se Derrite participará da conversa nem o local onde ela acontecerá.
Até então, somente policiais civis registravam os Termos Circunstanciados de Ocorrências (TCOs) em delegacias. Os TCOs são voltados para crimes que não ultrapassem penas de dois anos de prisão, como lesões corporais leves, desacato e vias de fato.
Além de dar aos policiais militares o poder de registrar os TCOs, a proposta prevê que os agentes da PM possam fazer diligências de casos que estejam acompanhando, apreendendo provas de crimes e solicitando a realização de exames periciais.
A pasta de Derrite comanda tanto a PM quanto a Polícia Civil. Para começar a valer, a decisão do secretário ainda precisa passar por um termo de cooperação com o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), o que ainda não ocorreu.
Os TCOs continuariam a ser registrados também por policiais civis, mas a proposta do secretário de permitir que PMs passem a ter esta possibilidade não agradou sindicatos e delegados da Polícia Civil.
Seus representantes acusam Derrite de dar à Polícia Militar o poder de investigar crimes, que não é atribuição de policiais militares. A função da PM, alegam, é o patrulhamento ostensivo. Cabendo aos policiais civis, segundo eles, a função de investigação e esclarecimentos dos casos.
A Comissão de Política Criminal e Penitenciária da Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo (OAB-SP) também se posicionou contrária à medida da SSP. Procurada pela TV Globo, ela classificou a proposta como inconstitucional porque o governo estadual não tem competência para legislar sobre a matéria.
Governador apoia medida
A decisão de Derrite de dar poder de polícia investigativa à PM conta com o apoio do governador do estado, Tarcísio de Freitas (Republicanos). O político negou na sexta-feira (19) que exista uma divisão entre policiais civis e militares no estado.
Segundo o governador, em 17 estados policiais militares já registram TCOs. “Não existe racha entre as polícias. A gente está querendo dar esse passo também. É razoável, já foi discutido. Tem acordo com a direção da Polícia Civil”, declarou Tarcísio.
Na visão do governador, há jurisprudência no Supremo Tribunal Federal (STF) que protege a medida e, portanto, não pretende recuar da ideia. “É um passo importante, que tem previsão em termos de previsão judicial”, afirmou.
O governador paulista também declarou que as recentes decisões da gestão de Guilherme Derrite na pasta da Segurança Pública não são de favorecimento exclusivo à Polícia Militar, em detrimento dos policiais civis, como a categoria tem verbalizado publicamente.
Na visão de Tarcísio, são medidas para melhorar a presença da PM nas ruas no combate aos crimes diários registrados em todo o estado.
“Não é questão de dar mais poder, é questão de melhorar o policiamento ostensivo. Para delito de menor relevância, é ruim desmobilizar uma guarnição, levar para uma delegacia de polícia e passar horas ali para fazer um boletim de ocorrência. O que estamos fazendo é melhorar o termo circunstanciado e isso deixa um efetivo maior na rua”, afirmou.
Além da PM, o governo também estuda a possibilidade de os agentes penitenciários fazerem os termos circunstanciados em ocorrências de menor porte nas penitenciárias.
Delegados criticam proposta
Por causa da polêmica, a Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (Adepol do Brasil) notificou Derrite sobre o que a entidade chama de “ilegalidades relacionadas a medidas institucionais recentemente implementadas no âmbito da Segurança Pública do Estado”.
“Causa perplexidade anúncios veiculados na imprensa dizendo que o governo de SP está atribuindo competência investigativa da Polícia Civil à Polícia Militar. (…) Não cabe à Polícia Civil, pela Constituição, a função de polícia ostensiva e preservação da ordem pública. De igual modo, não cabe à Polícia Militar o cumprimento de mandados de busca e apreensão, atividades de polícia investigativa ou de Polícia Judiciária”, informou a entidade.
Delegado Palumbo, deputado federal pelo MDB e representante dos policiais civis no Congresso Nacional, disse que Derrite está “usurpando a função dos policiais civis”.
Em nota, a Secretaria da Segurança Pública afirmou que “o atual governo reconhece e valoriza as suas polícias de forma igualitária”.
Porém, Jacqueline Valadares, presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo (Sindpesp), disse haver déficit de policiais civis em São Paulo.
“Nós temos um déficit de mais de 17 mil profissionais. Ou seja, a categoria está trabalhando com um efetivo 40% menor”, declarou.
Fonte: G1