“Arregalou o olho, não conseguindo respirar”, disse o protético Marcelo Camargo em seu depoimento nesta terça-feira (4) à Polícia Civil sobre como foram os últimos momentos de vida do namorado, o empresário Henrique Chagas, após passar por um peeling de fenol em São Paulo. O paciente pagou R$ 4,5 mil pelo tratamento.
Henrique morreu na segunda-feira (3), cerca de uma hora após fazer o procedimento com Natalia Becker. Ela é dona da clínica da Zona Sul de São Paulo onde o paciente e Marcelo, seu acompanhante, foram. Uma ambulância foi acionada para socorrer o empresário, mas ele não resistiu e faleceu dentro do estabelecimento.
O 27º Distrito Policial (DP), Campo Belo, apura as causas e eventuais responsabilidades pela morte de Henrique. A delegacia aguarda o resultado do laudo pericial para saber qual foi a causa da morte.
O caso, que antes era tratado como morte suspeita, passou a ser investigado como homicídio doloso com dolo eventual (quando se assume o risco de matar). Nesta quarta-feira (5), Natalia foi interrogada na delegacia e acabou indiciada por esse crime. Ela responde em liberdade.
Para a investigação, Marcelo é a principal testemunha do caso. O protético não foi localizado pelo g1 para comentar o assunto. Mas em seu depoimento na delegacia, ele falou o que aconteceu antes, durante e após Henrique passar mal e morrer. A reportagem teve acesso ao que foi dito. Veja a seguir os principais trechos:
” Não foi realizado nenhum exame clínico ou laboratorial como preparação para o ‘peeling de fenol’. Afirma que sequer foi medida a pressão de Henrique na clínica, antes do procedimento. Após Henrique passar mal, foi utilizado um aparelho de pressão de pulso e um oxímetro que não funcionava. Que na clínica não há nenhum tipo de aparelho de monitoramento cardíaco ou qualquer outro para prestar socorro, caso necessário.”
“[Uma funcionária] riscou a face da vítima com um instrumento que parece ter uma lâmina na ponta. Posteriormente, Natalia chegou, momentos antes de aplicar o fenol, riscando a pele de Henrique com o mesmo instrumento, também aplicando mais anestésico tópico. Que Henrique tomou um comprimido.”
“No momento da aplicação de fenol, Natalia pediu para Marcelo sair da sala, pois era muito forte o cheiro. Informa que estava longe da sala onde Henrique estava e sentia o cheiro do fenol, chegando a lhe incomodar. Que Henrique não estava de máscara na aplicação do fenol, apenas Natalia e sua assistente. Questionado sobre os riscos do procedimento, Marcelo afirmou que Henrique em momento algum foi alertado quanto aos possíveis efeitos colaterais ou riscos.”
“Henrique agendou uma consulta, aproximadamente 30 dias antes de realizar o procedimento, em 06/05/24. Afirma que acompanhou Henrique nesta consulta e que Natalia afimrou que era um procedimento superficial, explicando que a substância de fenol mais forte deveria ser realizada em centro cirúrgico, mas que o fenol que utilizava era mais fraco, não era tão concentrado, por isso poderia realizar o procedimento.”
“Relata que Henrique estava conversando, sentado na maca e pediu para Marcelo tirar fotos. Que repentinamente Henrique segurou forte seu braço e arregalou o olho, não conseguindo respirar. Na sequência, Marcelo começou a gritar e chamar ajuda. Informa que a funcionária não sabe dizer o nome adentrou, junto com Natalia. Que Natalia ficou muito nervosa e não sabia o quer fazer, ficando claro seu despreparo.”
“Natalia ligou para o marido Jorge [Macedo da Cunha] que estava próximo ao local dos fatos, relatando o ocorrido e Jorge chegou na sala que estavam, realizando também as manobras de massagem cardíaca e respiração boca a boca [em Henrique]. Informa que antes de Jorge chegar, com orientação do Samu [Serviço de Atendimento Móvel de Urgência] pelo telefone, iniciara as manobras de ressuscitação. Relata que após a chegada do Samu, Natalia não mais [foi] encontrada no local.”
“Esclarecimento: Não sou eu a ‘Natalia Becker’ da notícia da clínica de estética. É outra pessoa que tem o mesmo nome e último sobrenome. Nada relacionado.”
Foi com essa declaração acima, publicada em seu Instagram, onde tem mais de 350 mil seguidores, que a médica Natália Loewe Becker, esposa do goleiro Alisson Becker, da Seleção Brasileira de futebol, esclareceu nesta quarta-feira (5) a confusão criada nas redes sociais de que ela também seria dona da clínica de estética de São Paulo indiciada pela Polícia Civil pela morte de um paciente (saiba mais abaixo).
Além do acento no nome, que a homônima dela não tem, Natália Loewe Becker é médica. Segundo o seu registro profissional, ela teve vínculo com o Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul (Cremers), que foi cancelado em 2022, quando deixou o Brasil.
A consulta do registro do Cremers é pública. No caso, Natália foi morar com o marido no exterior. Alisson joga atualmente no Liverpool, da Inglaterra. Recentemente, o goleiro foi convocado para a Seleção que disputará a Copa América deste ano.
Já a Natalia Becker da clínica de estética não tem acento no primeiro nome e usa Becker como um sobrenome fantasia. Seu verdadeiro nome é Natalia Fabiana de Freitas Antonio. Ela tem 29 anos e não é médica. Também não é especialista em dermatologia. A polícia investiga se ela chegou a usar algum registro profissional falso ou de outra pessoa para se passar por médica em algum momento.
Natalia se apresenta como esteticista na web, onde se mostra como “premiada especialista” em tratamento contra melasma (manchas na pele). Ela fez um curso online para aplicar o peeling de fenol. Segundo uma das entidades que representam a classe de esteticistas no Brasil, a mulher não é registrada como esteticista na Associação Nacional dos Esteticistas e Cosmetólogos (Anesco).
Natalia diz ainda possuir três clínicas com o nome Studio Natalia Becker: em São Paulo, no Rio de Janeiro e em Goiânia. Tem mais de 230 mil seguidores no Instagram.
E foi na unidade da Zona Sul da capital paulista que a esteticista Natalia Becker virou notícia. Ela é a principal suspeita pela morte do empresário Henrique Silva Chagas, que passou por um peeling de fenol. O paciente morreu na segunda-feira (3) duas horas após o procedimento, ainda dentro da clínica.
“Estamos diante não apenas de uma morte, nós estamos diante de um crime de homicídio. O fato é que alguém causou a morte de outra pessoa”, disse à TV Globo o delegado Eduardo Luis Ferreira, do 27º DP.
Uma das suspeitas investigadas pela polícia é a de que Henrique possa ter tido algum tipo de reação alérgica ao tratamento e morrido por “choque anafilático” pelo uso de alguma substância química.
Laudo apontará causa da morte
Natalia realizou o tratamento com o fenol, que é um composto orgânico ácido, no rosto de Henrique. A substância química provoca uma reação inflamatória na pele. A inflamação causa descamação da superfície do tecido. O objetivo é reduzir manchas, rugas e cicatrizes, devolvendo a elasticidade da face.
Segundo o companheiro de Henrique, o também empresário Marcelo Camargo disse à polícia, antes do namorado se submeter ao fenol, foi aplicado um anestésico tópico no seu rosto. Depois lhe foi dado comprimido de um remédio contra dor.
Ainda segundo ele, Natalia não pediu exames prévios a Henrique para saber se o paciente era alérgico a algum medicamento.
Ao vê-lo, no entanto, o companheiro percebeu que Henrique tremia e estava nervoso. Logo depois, começou a respirar muito forte pela boca e pediu socorro. Natália e as funcionárias foram socorrê-lo e acionaram uma ambulância, que constatou a morte no local.
A Polícia Técnico-Científica realizou exames necroscópico e toxicológico no corpo do empresário para saber qual foi a causa da morte de Henrique e quais substâncias ele ingeriu. A delegacia que investiga o caso aguarda o resultado dos testes. Policiais apreenderam equipamentos e medicamentos na clínica para passarem por perícia.
Fonte: G1