Enchentes forçam famílias da zona leste de SP a improvisos: ‘Fizemos um sobrado para não perder tudo’

por Redação

Maria Amélia do Canto Nascimento, de 58 anos, gastou mais de R$ 7 mil para instalar comportas em frente à casa onde mora, em uma tentativa de fazer com que a água entre com menos intensidade e dê a chance de salvar seus pertences durante as enchentes. Desempregada no momento, a mulher também reformou sua residência e a transformou em um sobrado para evitar a perda de roupas e documentos durante as tempestades.

“Tivemos que fazer um sobrado, para não chegar a perder tudo. Só que na cozinha perdemos armários, máquina de lavar roupa… todo ano é a mesma coisa”, afirmou Maria Amélia, que mora há 50 anos no bairro e já viu duas mortes por conta dos alagamentos.

Essa é a realidade dos moradores do Itaim Paulista, na zona leste de São Paulo (SP), que enfrentam há anos o mesmo problema: chuvas torrenciais que tomam as casas e fazem com que eles percam todos os móveis, eletrodomésticos e documentos, enquanto tentam sobreviver à invasão das águas e manter a segurança dos entes queridos e vizinhos.

De acordo com lideranças comunitárias, as denúncias são feitas anualmente ao poder público e, apesar de algumas medidas tomadas, nunca são o suficiente para que as enchentes cessem.

Roberto Dias dos Santos, de 51 anos, é motorista e mora há sete anos em um condomínio financiado pela Caixa Econômica Federal e, desde então, sabe que anualmente terá que ajudar os vizinhos a minimizarem as perdas nas enchentes. O apartamento onde mora fica em um andar mais alto, então as águas não entram em sua casa.

Durante o jogo do Brasil contra a Suíça na Copa do Mundo, na segunda-feira (28), Roberto conta que a sorte foi que todos estavam em casa quando ocorreu a chuva, que deixou a capital inteira em estado de atenção para alagamentos. Assim, a vizinhança pôde se ajudar.

Assim como Amélia, Roberto e os vizinhos precisaram pagar para colocar comportas em frente ao prédio, para evitar ou ao menos diminuir a entrada da água. Mesmo com essa medida, ele afirma que começa a chover e as mães que moram nos primeiros andares com os filhos começam a gritar, sabendo que, mais uma vez, perderão tudo.

“Nós compramos este apartamento com todo o suor da nossa vida e não sabemos mais para onde correr. Por que quando você compra uma casa da Caixa tem que passar por esse problema?”, pergunta o morador.

Poder público
Euclides Mendes, de 51 anos, apelidado de Kiko pelos vizinhos, é líder comunitário da região e já foi responsável por protocolar algumas denúncias no Ministério Público. Para ele, as ações realizadas pela Prefeitura de São Paulo, como fazer a limpeza dos córregos, minimizaram algumas consequências das chuvas, mas ainda não foram o suficiente. Até mesmo porque o rio Tietê, maior curso d’água da região, continua muito poluído. “Não adianta fazer a obra e não fazer a limpeza. O governo não está fazendo o básico.”

“É uma visão sistêmica. Os rios e cursos d’água são um sistema. Se você não tem uma limpeza dos rios maiores, os menores não dão conta. Por muitos anos nós demos as costas para os nossos rios”, afirmou a arquiteta, professora e diretora da FAU (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo) do Mackenzie, Angélica Benatti Alvim.

A ausência de políticas públicas prejudica muito a vida das pessoas que precisam conviver com a ameaça iminente de perder tudo em enchentes. Para a especialista, é necessário um conjunto de medidas estruturais e ligadas à engenharia, como planejamento urbano e implementação de áreas permeáveis e impermeáveis, além de diminuir a velocidade das águas que correm das áreas mais altas para as mais baixas.

Educação ambiental é outro fator defendido pela arquiteta, porque, independentemente da faixa de renda, a população tende a jogar lixo nas ruas, o que entope os bueiros e contribui com os alagamentos pela cidade.

“É necessária uma integração entre setores. Não podemos pensar apenas no estrutural. Faz parte de um círculo vicioso. É uma ausência de políticas públicas, que, por sua vez, leva as pessoas a morarem nessas condições”, afirma Angélica Benatti Alvim.

“A coisa mais horrível que tem é ver as pessoas perdendo os móveis. Dói muito, dói demais”, diz Kiko.

Em nota, a Prefeitura de São Paulo informou que finalizou a recomposição das margens do córrego Lajeado em cinco trechos e que trabalha no planejamento das obras de microdrenagem, pavimentação e macrodrenagem da região do Jardim Pantanal (área de várzea do rio Tietê).

A gestão diz que intensificou as ações de zeladoria de toda a região na última semana e em períodos chuvosos e que o trabalho preventivo contra enchentes é feito todos os dias pela limpeza de córregos, além da desobstrução de poços de visita e bueiros.

Fonte: Com informações da Agência Estado

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