Como a Agência de Imigração dos EUA está manipulando o Google para criar uma falsa ideia de operações em massa

por Redação

Notícias de prisões, batidas e deportações em massa inundaram os EUA desde o retorno de Donald Trump à Casa Branca, no fim de janeiro. O temor em relação aos agentes da Agência de Imigração e Fiscalização Aduaneira (ICE) se espalhou por comunidades da Costa Leste a Oeste do país, alimentado por rumores que intensificam o clima de caça à imigração irregular. Mas parte dessa atmosfera parece não passar de uma miragem meticulosamente manipulada.

Uma pesquisa rápida no Google com palavras-chave como “operation” (operação), “raid” (batida) e “arrest” (prisão) junto com “ICE” e diferentes estados ou cidades nos EUA mostra comunicados de imprensa da agência governamental liderando os resultados de pesquisas.

As manchetes incluem “ICE prende 85 durante operação de 4 dias no Colorado” e “Nova Orleans tem operações visando 123 criminosos estrangeiros”, por exemplo. Na página inicial do Google, os links aparecem com a data de 24 de janeiro de 2025, sugerindo que as supostas operações teriam ocorrido quatro dias após a posse de Trump.

Mas uma análise mais aprofundada mostra outra narrativa.

Ao clicar nos links, aparece no topo da página um aviso de “conteúdo arquivado”, explicando que a página “contém conteúdo de uma administração anterior ou está desatualizada”.

A operação em Colorado? Aconteceu em novembro de 2010. A ação em Nova Orleans? Foi em fevereiro do ano passado.

Segundo o jornal britânico Guardian, que primeiro noticiou a manipulação, há milhares de exemplos de comunicados de imprensa antigos, em todos os 50 estados americanos, que foram atualizados em 24 de janeiro, dando a falsa ideia de que as operações seriam recentes.

O GLOBO testou o experimento. Em uma busca por “ICE raid Idaho”, em uma janela anônima, o quinto resultado na página inicial da pesquisa — e o único do site do ICE — tem como manchete “ICE prende 22 pessoas em uma onda de fiscalização migratória em Idaho” e data de 24/01/2025 (sem especificar, na busca do Google, se é uma atualização ou a data original). Ao clicar no link, a página informa ser um conteúdo arquivado, com data original de 23 de julho de 2010.

Amplitude nacional
Segundo o Guardian, o movimento veio à tona após uma advogada de imigração, que falou ao Guardian sob anonimato por temer represálias, começar a rastrear batidas do ICE a partir da posse de Trump para criar um mapa nacional das operações.

De cara, ela reparou que havia um padrão estranho quando operações de mais de uma década surgiram na página principal do Google com uma data recente. Em cada um dos estados, havia pelo menos um comunicado de imprensa do ICE antigo, atualizado em janeiro deste ano, entre os links de destaque no buscador.

“Já fiz isso em todos os 50 estados… e em várias cidades. E é a mesma coisa”, disse a advogada ao diário britânico. “Todos eles tinham a última atualização de 24/1/2025 e estavam todos aparecendo na frente do algoritmo.”

A mulher, então, deu início a uma investigação digital com ajuda de um amigo especialista em tecnologia.

O resultado leva a crer que a agência está deliberadamente manipulando o principal buscador do mundo. Ao Guardian, o ICE não retornou o seu pedido de resposta.

Um porta-voz do Google, por sua vez, disse que o objetivo do buscador é “refletir a última vez que uma página foi atualizada” e que seus “sistemas não são projetados para aumentar a classificação de uma página simplesmente porque eles atualizam seu carimbo de data/hora”.

Temor no ar
Maria Andrade, uma advogada de imigração no estado rural de Idaho, disse ao Guardian que até o momento não tem havido grandes operações do ICE na região, e a única que teve não resultou em prisões. No entanto, o primeiro resultado no Google na busca por “ICE arrests Idaho” é o comunicado antigo do ICE falando sobre as 22 pessoas presas.

— Se o objetivo é assustar as pessoas que procuram por batidas em Idaho, essa seria uma boa maneira de conseguir isso e enganar as pessoa — disse Andrade.

Fonte: OGLOBO

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